segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Tópicos sobre a poética de Álvaro de Campos

      Para Campos (o mais moderno dos heterónimos de Fernando Pessoa), sentir é tudo e o seu desejo é “sentir tudo de todas as maneiras”. O sensacionismo torna a sensação a realidade da vida e a base da arte. O EU do poeta tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou possibilidade de existir.

Álvaro de Campos é quem melhor procura a totalização das sensações, mas sobretudo, das percepções conforme as sente, ou, como ele próprio afirma, “sentir tudo de todas as maneiras”.

O sensacionismo de Campos começa com a premissa de que a única realidade é a sensação. Mas a nova tecnologia na fábrica e nas ruas da metrópole moderna provoca-
-lhe a vontade de ultrapassar os limites das próprias sensações, numa vertigem insaciável.

Ao tentar a totalização de todas as possibilidades sensoriais e afectivas da humanidade, em todo o espaço, tempo ou circunstâncias, num mesmo processo psíquico individual, o sensacionismo faz o mesmo que o unanimismo francês (movimento poético do início do século XX que, em reacção contra o individualismo e as estéticas do descontínuo, procura criar laços entre os grupos humanos, interpretando a sua alma e a sua vida, acreditando na possibilidade de uma alma “unânime”, na solidariedade e na importância da colectividade para fazer face às situações reais e ameaçadoras da vida moderna).
      A obra de Álvaro de Campos passa por três fases:


- a decadentista – que exprime o tédio, o cansaço e a necessidade de novas sensações (“Opiário”); o decadentismo surge como uma atitude estética finissecular que exprime o tédio, o enfado, a náusea, o cansaço, o abatimento e a necessidade de novas sensações. Traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia. Com rebuscamento, preciosismo, símbolos e imagens apresenta-se marcado pelo Romantismo e pelo Simbolismo.


- a futurista e sensacionista – nesta fase, Álvaro de Campos celebra o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna. Apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina por oposição à beleza tradicionalmente concebida. Exalta o progresso técnico, essa “nova revelação metálica e dinâmica de Deus”. A “Ode Triunfal” ou a “Ode Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e totalização das sensações.


- a intimista – que, perante a incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento, que provoca “Um supremíssimo cansaço, / Íssimo, íssimo, íssimo, / Cansaço…”. Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido. Sofre fechado em si mesmo, angustiado e cansado. (“Esta velha angústia”; “Apontamento”; “Lisbon revisited”).

O drama de Álvaro de Campos concretiza-se num apelo dilacerante entre o amor do mundo e da humanidade; é uma espécie de frustração total feita de incapacidade de unificar em si pensamento e sentimento, mundo exterior e mundo interior. Revela, como Pessoa, a mesma inadaptação à existência e a mesma demissão da personalidade íntegra.

Campos busca, na linguagem poética, exprimir a energia ou a força que se manifesta na vida. Daí o surgimento de versos livres e muito longos, vigorosos, submetidos à expressão da sensibilidade, dos impulsos, das emoções (através de frases exclamativas, de apóstrofes, onomatopeias e oximoros).

Fonte: Preparação para a Prova de Exame Nacional -2003-12º ano, Vasco Moreira e Hilário Pimenta, Porto Editora

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